PROVA OBTIDA MEDIANTE ACESSO NÃO AUTORIZADO A APARELHO CELULAR É ÍLICITA MAS PODE SER REPETIDA

São considerados meios de obtenção de prova ilícitos aqueles que violam normas de direito material ou constitucional – isto é, meios probatórios que invadam a esfera da dignidade da pessoa humana do investigado. Nessa perspectiva, a Constituição Federal resguarda a privacidade das comunicações telefônicas e telemáticas em seu art. 5º, inc. XII, elevando-a ao patamar de direito fundamental. Por decorrência lógica, qualquer meio de obtenção de prova que viole gravemente o direito à privacidade do indivíduo é, pois, ilícito; assim, as provas eventualmente obtidas são imprestáveis.

A troca de mensagens pelo aplicativo WhatsApp reconhecidamente se reveste da proteção constitucional da privacidade por conter dados sensíveis que, notadamente, dizem respeito à vida pessoal do usuário. Destarte, por conter um universo de informações muito mais abrangente do que o objeto da investigação criminal, o acesso ao aplicativo de mensagens WhatsApp é vedado, salvo nas hipóteses de (a) autorização direta pelo proprietário do telefone celular; ou (b) autorização judicial, calcada na imprescindibilidade para o andamento investigativo, e adequadamente fundamentada.

Nessa linha, o acesso, sem autorização, é considerado prova ilícita. Via de regra, a ilicitude é vício que torna a prova irrepetível, uma vez que se vincula ao momento de sua obtenção. No entanto, especificamente quanto ao acesso ilegal ao aparelho celular do investigado, a 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu ser a diligência de acesso passível de repetição com autorização judicial (Reclamação nº 36.734/SP. 3ª Seção. Relator: Min. Rogerio Schietti Cruz. Publicado em 22 fev. 2021). Neste caso, ainda que a autoridade policial tenha acessado as informações do telefone celular ilicitamente, o juiz pode, em momento posterior, autorizar a realização de perícia no aparelho.

No entanto, não se pode desconsiderar que, com frequência, a prática delitiva é descoberta apenas após a verificação do aparelho celular, especialmente em casos em que há flagrante delito. Assim sendo, ainda que o telefone celular seja preservado durante o processo judicial, com observância da cadeia de custódia, a ação penal é eminentemente embasada em prova ilícita. Com base nesta fundamentação, o Superior Tribunal de Justiça anulou o processo desde seu início, embora tenha permitido ao Ministério Público o requerimento de acesso ao aplicativo WhatsApp, agora com autorização judicial, considerando-se a hipótese de eventual renovação da ação penal.

Por: Marcos Eberhardt
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