Neste ano que está findando, uma situação ficou, infelizmente, ainda mais evidente: o uso indevido da máquina pública por gestores. Justamente aqueles que deveriam zelar pelo erário e, obvio, pelo recurso do contribuinte. Há de ser comemorado, contudo, que, na região central do Estado, não tivemos casos de apropriação ou desvios de recursos dos cofres.
Ainda assim, o Rio Grande do Sul viu, neste 2020, prefeitos e servidores sendo investigados e, até mesmo, afastados em municípios como Imbé, Santana do Livramento, Viamão e Farroupilha. Igualmente importante destacar que, nesta empreitada contra os malfeitores, a Secretaria de Segurança Pública do Estado se somou, junto ao MP, para conter os ilícitos. A situação que, por si só, já é critica, ficou ainda pior após o surgimento de casos corrupção em meio à pandemia – com crimes licitatórios, sobrepreço, superfaturamento, entre outros.
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A coluna, o professor de Direito Penal da PUC e advogado, Marcas Eberhardt (foto). afirma que o empresário tem um papel fundamental no desenvolvimento de mecanismos para um contrafluxo nas janelas de corrupção. No cotidiano da atividade empresarial, a formação de uma cultura de prevenção exige a implementação de procedimentos internos de integridade, incentivando a denúncia de irregularidades e aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta pelas empresas e seus colaboradores. Ou seja, os mecanismos de compliance são peça fundamental no relacionamento público-privado.
Além da responsabilidade criminal, tanto o gestor público quanto o empresário poderão ser responsabilizados pela Lei de Improbidade. Eberhardt explica que a Lei no 8.429/92 foi editada com foco na responsabilização do gestor e do servidor público com que tenham má gestão do erário público.
Confira abaixo, a entrevista:
Diário – Ao que se deve atribuir o número expressivo de operações realizadas pelo MP, em 2020: aumento da fiscalização ou aumento de denúncias?
Eberhardt – No Rio Grande do Sul, temos um MP extremamente atuante, o que garante uma constante fiscalização dos gestores públicos, gerando uma crescente especialização nas ferramentas de investigação. Evidentemente que a participação dos demais órgãos de controle, como o Tribunal de Contas, também é um vetor que contribui na identificação de atos irregulares.
Diário – Alguns prefeitos foram afastados e, até mesmo, presos. Os gestores municipais devem estar atentos…
Eberhardt – A fiscalização e a eventual punição de gestores públicos não devem ser encaradas como uma ameaça. Mas, sim, como uma certeza de que as instituições de repressão penal e administrativa funcionam em favor do interesse público. O momento é, portanto, de prevenção e adoção de mecanismos que permitam aos gestores a tomada de decisões de acordo com as determinações legais. Não se trata de um engessamento da atividade pública. Mas, sim, da implementação de uma cultura de integridade que permita administrar afastando-se de condutas ilícitas.
Diário – Ainda prevalece a cultura de que o crime compensa?
Eberhardt – A reputação empresarial é um fator de grande relevância no mercado, de modo que a mera sugestão de envolvimento do empresário no cometimento de ilícitos tem gerado repercussões negativas imediatas em grandes negócios. Portanto, a cultura de que o “crime compensa certamente não deve pautar empresários e gestores que buscam longevidade.
Diário – Qual o papel das empresas nesse processo? E, especialmente, aquelas que firmam contratos com prefeituras para a prestação de serviço?
Eberhardt – O papel fundamental do empresário é, além de prestar um serviço adequado, exigir de seus colaboradores, parceiros e dos gestores públicos um agir pautado pela prevenção de condutas que possam significar o descumprimento da lei.